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O Guerrilheiro das Farc.
O Guerrilheiro das Farc.

Manhã de domingo amena, temperatura agradável... do tipo que faz com que uma viajem longa se torne prazerosa.

Era o ano bom de 2003, mais precisamente no mês de fevereiro. Recordo-me porque o Presidente Lula havia acabado de tomar posse na Presidência da República Federativa do Brasil.

Vinha eu das férias que havia passado na fazenda de um amigo no glorioso Estado do Tocantins e estava acompanhado de ninguém mais que meu amigo, o respeitável “Generalíssimo” Coronel José Telêmaco, o Generalíssimo é por conta de sua aposentadoria no Exército Brasileiro. Filho de Ulysses e Penélope, tais como os personagens da tragédia grega, homem de risos largos e de humor a toda prosa, piadista de uma mordacidade e de tirocínio de uma rapidez incrível.

Estávamos vindo de Paraíso do Tocantins com destino ao Distrito Federal.

Na época eu administrava um órgão público ligado ao Governo do Distrito Federal -  A Rodoferroviária de Brasília, havíamos feito uma parada na “Matinha”, onde tem restaurante, lanchonete, posto de combustíveis, lojas especializadas, borracharia e conveniência, todo viandante que passa na “Rodovia Belém Brasília” forçosamente a conhece, é um ponto de parada tradicional.

Fomos ao toalete, demorei um pouco mais, pois estava o protótipo do desleixo e descuido no asseio pessoal, a barba enorme, imagine 31 dias sem  raspar, o cabelo um horror... na cabeça uma boina com uma estrela e uma foice no centro e escrito a palavra “CHÉ” em vermelho, vestindo camisa e calças camuflada, velha e desgastada pelo tempo, presente do meu amigo coronel,  sandália de couro gasta pelo uso, mochila nas costas, enfim, esse era o meu aspecto.

Aproximei-me da entrada da lanchonete e na entrada uma mocinha simpática ofereceu-me a tal de “comanda”, que é onde se anota o consumo realizado por cada cliente, para se pagar à saída, o amigo Coronel José Telêmaco já estava lá no balcão deliciando o seu cafezinho, quando me dirigi ao balcão, ouvi o atendente - que apesar da distância tenho ouvidos de tuberculoso - que me havia lançado um olhar perscrutador perguntar ao Coronel:

- Aquele rapaz não é Brasileiro não?

Ao que o Coronel imediatamente numa de suas sacadas de humor respondeu:

- Não. Ele é um guerrilheiro das Farc, a quem eu estou dando uma carona desde a balsa de Miranorte no estado do Tocantins.

O atendente voltou a  indagar:

- Pra onde ele vai?

Vai à Brasília falar com o Presidente Lula! - respostou o coronel com um risinho cínico na cara. No que despertou no rapaz em questão, a curiosidade de saber qual seria o assunto da audiência?

Ao que o Coronel olhando pra mim ainda a certa distancia me deslocando para o balcão respondeu:

Ele vai pedir a libertação daquele traficante famoso Fernandinho Beiramar... isto provocou no rapaz uma reação inesperada!

Então  ele retrucou:

- Mas que absurdo o senhor está me falando? No que foi interrompido pelo Coronel com minha aproximação dizendo:

- Cuidado com o que você  fala, ele não fala português, mas entende tudo o que falamos!

Nisso aproximo-me do balcão -  já com o personagem incorporado, apesar de aquela conversa não ter durado mais de vinte segundos, ouvi e entendi tudo o que estava se passando. Aproximei-me do atendente e em portunhol bem claro e sonante falei-lhe:

- Un Cafezito por favor!

O rapaz vindo me servir o cafezinho tremia que parecia vara verde, pensei que na xícara não ia ficar  uma gota de café.

Peguei o pires com a xícara das suas mãos todo derramado de café, mas me mantive muito sério e não dei a mínima atenção pro atendente e nem bulhufas para o assunto que havia ouvido e comecei a saborear o cafezinho.

Nisto ele me olhando muito sério, disparou de chofre a pergunta:

- O Senhor vai fazer o quê em Brasília? Respondi num tom alto e firme:

Voy hablar  com nel  Presidente Lula! És uma injusticia mantener presionado um hombre como Nandinho Beiramar! Nandinho Beiramar és amigo de las Farc, és el hombre que ayuda el pueblo sufriente de Colombia... Libertad yá para Nandinho Beiramar!

Podia-se ouvir um mosquito voando. Toda a Matinha movimentada naquele horário, pois, começava-se a servir o almoço, num silêncio sepulcral...

O rapaz não se dando por vencido voltou à carga:

- Mas o senhor vai pedir a libertação de um bandido? Ao que aduzi imediatamente:

- Entonces... por que no se aprisionan los políticos de esse país, que pasan la mano el nel dinero del pueblo?

- Mas os políticos brasileiros são assim mesmo... mal ele terminou a frase, uma outra atendente do balcão vizinho veio gritando em alto e bom som em direção do colega de trabalho:

- Êeeepaaa! Alto lá meu amigo, político brasileiro não é tudo assim não! E iniciou-se uma altercação entre os dois, pois a atendente acreditava-se diante de um verdadeiro cidadão colombiano, e veio em defesa da sua pátria amada.

Nesse comenos o atendente colocando a mão na cintura, interrompendo a discussão com a colega, atirou mais uma pergunta:

- Baseado  em quê... o Senhor vai pedir a libertação daquele bandido?

Ao que o Coronel ali do lado que havia me jogado na fogueira, admirado por ver que eu estava representando o papel que ele havia criado, até  além do que ele esperava rispostou:

- Dinheiro! Ao que aduzi imediatamente:

- Muchos dólares fueram investidos por las Farc en la campanha del Presidente Lula acá em Brasil! Por eso, és uma injusticia mantener presionado um hombre como Nandinho Beiramar! Nandinho Beiramar és amigo de las Farc, és el hombre que ayuda el pueblo sufriente de Colombia... Libertad yá para Nandinho Beiramar!

Terminei de tomar o café, deixei o pires e a xícara sobre o balcão, virei as costas e fui saindo, quando ouvi um senhor de idade que estava prestando atenção na conversa  perguntar ao Coronel:

Me diz uma coisa, o Senhor não tem medo desse homem te matar antes de chegar a Brasília não?

Seguramos o riso e saímos, já no carro rimos da brincadeira, do inusitado e de como as coisas aconteceram. Enfim, as pessoas acreditaram. Não havíamos ensaiado nada, aconteceu...

O Coronel ria desabridamente, admirado de ver como eu havia me saído da armadilha que ele me armou.

Retornamos à Brasília, retomei minhas atividades na seção pública, cortei o cabelo e fiz a barba. Na sexta feira daquela semana, fui convidado por um amigo comum, meu e do Coronel, para passar o final de semana em sua fazenda localizada em Uruaçu- Go, que dista da Matinha uns 50km.

Chegando a Uruaçu, o Valmir empresário do ramo gráfico, que tem sua empresa na Cidade Administrativa do Guará me disse:

- Vamos comer um lanche no Bar do meu irmão aqui no centro da cidade? Topei, fomos. Já sentados em conversa animada, um fazendeiro amigo dele descendo de uma caminhonete aproximasse da mesa e diz no seu sotaque goiano:

- Ô seu Valmí! Cê num imagina de onde eu venho! Venho lá da Matínha, ocê num acredita que passou por lá um bandido, um traficante Colombiano? E sabe o que ele ia fazer em Brasília? Pedir ao Presidente Lula a libertação daquele outro bandido Fernandinho Beiramar.

Nisso eu olhando pra ele repeti solenemente:

 - Nandinho Beiramar és amigo de las Farc, és el hombre que ayuda el pueblo sufriente de Colombia... Libertad yá para Nandinho Beiramar!

Aí ele disse admirado me olhando:

Era você né seu bandido?!?!?!

E Explodimos todos em uma boa gargalhada!

Dizem até hoje, que essa história ainda corre por lá, e juram que o guerrilheiro era perigosíssimo, que matava só pra ver o tombo!

Mas, essa é uma outra história...

 

Antônio Costa de Morais

                                                                                                                             Ator e Poeta e Escritor


TELÊMANCO NA FESTA RAVE

“Solteiro sim, sozinho nunca” Tema

O Coronel José Telêmaco é um misto de ficção com realidade,  vindo do reino de Ítaca, na Grécia Antiga, filho de Ulisses vencedor em Tróia: aquele que vagou mar afora por dez anos até retornar cansado para casa.

 

Depois de passar por (quase) tudo nesta vida, nosso herói foi parar numa Festa Rave em pleno Século XXI. Não é de se duvidar que tenha ido também a um Baile Funk em uma “comunidade” no Rio de Janeiro, mais isso é para outra história.

Veja então como o inusitado aconteceu:

- Numa tarde ensolarada de Primavera Telêmanco resolveu praticar uma boa ação. Doou 170 dólares para uma jovem que muito necessitava.

Consolada, a pequena agradeceu a gentileza sem antes pedir que o Coronel desse carona para ela e mais quatro amigas que iam “bombar” numa Festa Rave, no amplo jardim de uma famosa casa de eventos no Lago Sul.

E lá foi o benfeitor. Era cinco loiras de “parar o trânsito”, cada uma exibindo suas formosuras naturais e artificiais; pearcing’s e tatuagens nos pontos provocantes e imagináveis de seus corpos “sarados” e bronzeados.

Cada uma ao seu estilo exibia seios exuberantes – naturais ou siliconizados – cabelos bem tingidos e arrumados, peles perfumadas com mais finos aromas franceses, nutridas pelo abundante estrogênio.

E lá se foi o Coronel – com seu típico chapéu panamá, blazer de corte italiano, mãos aos bolsos, calça esportiva e tênis casual – como se fosse uma ilha, rodeado de “beldades” por todos os lados de dar inveja ao Rei Salomão ali nitidamente vencido pelo critério da qualidade.

 

Antes quis saber o que seria uma festa Rave? Sem definição precisa, restou explicado tratar-se de uma festa “descolada”, onde rola quase tudo, numa convivência harmônica entre maioria e minorias, tais como heteros, gays e lésbicas tudo na mais perfeita naturalidade. 

A princípio servia apenas como motorista do quinteto de musas o que já seria satisfatório para si, até que, em recompensa a sua gentileza, uma das garotas estendeu-lhe o convite:

- O Senhor é nosso convidado especial. Telêmanco hesitou: não, não, não! Tenho compromissos! Minha esposa, meus filhos, meus amigos! O que vão pensar de mim? (ou o que já pensaram ou sabem!)[1]

Hesitou mais não resistiu. Lembrou das festas que promovia em sua mocidade. Recordou do ingênuo baile no Clube dos Oficiais onde a senha era: “O amor está no ar”! A festa Rave seria apenas a “evolução” daqueles reprimidos tempos.

- Penso, logo existo; vivo, então eu posso: Yes, we can!. Ponderou firmemente o Coronel. Vamos sim! Após entregar a chave do automóvel ao manobrista, dirigiu-se elegantemente e cheio de estilo à entrada, por sinal muito bem acompanhado.

A comitiva chamava cada vez mais a atenção dos presentes. Um “coroa” cheio de estilo acompanhado de cinco garotas, do tipo “capa de revista”. Quem será o figurão?

– Deve ser um Magnata. Um Senador. Um Ministro da República. Ou quem sabe, um Shake! Era o comentário geral. 

Na tenda etílica, ao lado do palco principal, servia-se fartamente Red Label, tekila, vodka e energéticos. Brindaram à primeira rodada.

Telêmanco não bebia desde que o Dr. Crisípola lhe alertara sobre aesteatose epática. Uma ou duas doses não lhe faria mal, pensou, todavia logo ficou tonto e assim não foi difícil “balançar o esqueleto” ao som do “pancadão” da música eletrônica e sob os efeitos alucinógenos da luz!

Ao seu redor as lindas garotas dançavam, subindo e descendo, esfregando-lhe peitos e cochas, pela frente, por trás e pelos lados, alternadamente numa coreografia explicitamente sensual, e por que não dizer explicitamente sexual? Era o céu em plana terra!

Daí em diante não se pode mais narrar o que presenciou o nosso herói que pensava já ter visto de tudo na vida. Ledo engano!

Num certo momento o D’J pediu a atenção de todos para anunciar oficialmente a presença de um ilustre conviva:

- Saudemos todos ao Coronel José Telêmanco que nos abrilhanta com a sua presença honrosa! Fiquem todos à vontade que hoje a polícia certamente não nos incomodará! Não haverá propina nem extorsão! Som na caixa D’J! Tá liberado, tá tudo liberado!  

Telêmanco surpreso, despediu-se apressadamente das musas del fuego, entregando-lhes o dinheiro para o taxi, e, livrando-se do insistente assédio dos gays e das lésbicas, saiu de fininho antes que fosse servido o prato principal da noitada. Foi salvo pelo gongo! Já imaginou um coronel do exército, quase general, flagrado naquelas condições?

 

De volta para casa pensou: Eu estou vivo, são e forte! Essas coisas acontecem com as melhores pessoas, são fatos da vida. Confesso que não queria, porém não podia viver sem ir a uma Festa Rave. Ressalvados todos os excessos lá praticados e cometidos, o que muito lamento, valeu a penal.

Vou sair correndo para contar mais essa para meus amigos da velha guarda da Caserna. Vocês não sabem o que estão perdendo!

 

Abandonem a tristeza e esse velho pijama e venham escrever, nas horas vagas da vida, suas ficções e memórias, assim como eu, o Coronel José Telêmanco, o filho de Ulisses, pois, como disse o poeta Cazuza, “O tempo não pára”. Viva a rebeldia!     

 

Brasília, 08 de Novembro de 2010.

 

Cel. José Telêmanco.



[1] Nota do Autor